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Cirurgiões realizam cirurgias a distância no Canadá

- Rebeca Borges



Matéria da BBC de Maio de 2014 retrata inovação realizada no Canadá.

Com tradução livre de Sérgio Gaudêncio.

 

Quando Mehran Anvari pega um instrumento cirúrgico e corta o corpo de um paciente, ele não usa suas próprias mãos. De fato, ele nem está na mesma sala. Ele opera pessoas que estão a 400 quilômetros de distância.

A partir de um console no St Joseph’s Hospital em Hamilton, Canadá, ele controla um robô cirurgião de uma parte completamente diferente do país, cortando, costurando e removendo pedaços. Ele já conduziu mais de 20 operações até então, incluindo operações do colo e reparos de hérnia.

A tecnologia por trás das cirurgias a distância já está madura o suficiente para ser usada mais amplamente, permitindo que as pessoas tenham acesso a especialistas mundiais e aos melhores centros de saúde sem ter que viajar. Poderá isso vir a ser usual para os hospitais?

Um robô simula pontos de costura em uma base submersa, sendo controlada pelo cirurgião Mehran Anvari na superfície. (David Williams)

O nascimento da telecirurgia não aconteceu com os procedimentos cotidianos em mente. De fato foram assuntos longe da Terra que deram início ao movimento do médico robótico. Logo que as pessoas começaram a considerar factíveis as viagens espaciais, elas começaram a imaginar como eles cuidaram de um humano a milhares de milhas distantes de um médico. Na década de 1970, a NASA sugeriu que pesquisadores investigassem a opção de robôs controlados remotamente para operar astronautas. Desde então, NASA e o Exército dos EUA têm trabalhado firmemente para criar robôs confiáveis que pudessem operar alguém a distância. Em 2006, Anvari usou um robô para costurar um paciente que vivia no oceano, na base Submerse Aquarius, para similar como a teledirigia espacial poderia ser.  

O robô cirurgião Da Vinci por controle remoto executa uma cirurgia

Porém, como a maioria das coisas que se iniciam no espaço e no campo militar, as inovações da pesquisa da telecirurgia também vazou para a vida civil (os chamados spin offs). Em 2001, a primeira operação transatlântica foi conduzida por cirurgiões em Nova Iorque em um paciente na França. E recentemente, o primeiro sistema de cirurgião robótico foi introduzido no mercado, geralmente controlado por um cirurgião próximo.

O robô de Anvari, chamado Zeus, atua de um hospital comunitário que necessita das mesmas instalações e expertise que as do médico. Mas fora o local, ele afirma que não há muita diferença. “É o mesmo que eu estivesse na sala de cirurgia, ” confirma. “Tenho ambas as mãos no robô do mesmo jeito que teria instrumentos em ambas as mãos. ” Ele movimenta a câmera robótica que lhe serve de olhos, e pode falar com as enfermeiras na sala de cirurgia com o paciente para lhes dar instruções. “Basicamente, é o mesmo que se eu estivesse próximo ao paciente, apenas usando telecomunicação e robóticas. Não parece ser diferente em nada. ”

Mehran Anvari controla seu robô cirurgião, conduzindo uma cirurgia guiada (St Joseph's Healthcare)

Melhores linhas terrestres e cabos de conexões de internet transformaram o delay em algo menos grave. Quando Anvari operou seu primeiro grupo de pacientes, havia um delay de cerca de 175 milissegundos, o que é imperceptível.  No entanto, a distância provoca mais delays, e as interrupções podem ocasionar desastres. “Não é realístico esperar que esses robôs ajam no modo de piloto automático e terminem a cirurgia, ” opina Tamas Haidegger, pesquisador da Obuda University em Budapeste que estuda telecirurgia espacial.

Isso certamente será um assunto para operações conduzidas a grandes distâncias – tais como no espaço profundo ou Marte. Lá, robôs que usam algoritmos e base de dados para tomar decisões durante a cirurgia serão necessários, afirma Mangai Prabakar, engenheira da Florida International University que projeta robôs inteligentes. “Se eles puderem manter a comunicação entre a Terra e a nave especial, eles poderão ser conduzidos por cirurgiões na Terra, ” disse ela. “Mas Marte é muito longe e não podemos nos comunicar de uma distância tão grande. ” Mangai afirma que para viagens espaciais de longa distância, teremos que construir robôs nos quais podemos confiar para fazer cirurgias completas, sem que um humano conduza o bisturi da Terra. Isso demandará computadores incrivelmente potentes.  

Cirurgião inteligente

Em suma, cirurgias são difíceis. “Você tem um plano cirúrgico mestre, e as coisas podem sair erradas, ” aponta Haidegger. “Não podemos prever o que vai acontecer em um estado avançado da cirurgia. Se a circulação sanguínea vai a colapso, a respiração para, ou se há uma reação não prevista a drogas e produtos químicos, esses são casos que demandam um cirurgião treinado no local da cirurgia. ”

Contudo, Haidegger acredita que um robô de controle remoto ampliado com inteligência artificial virá com o tempo e com o aumento da demanda. E essa demanda provavelmente virá tanto do espaço quanto da Terra. O crescimento dos voos espaciais comerciais tem gerado questões interessantes sobre as cirurgias telerobóticas. Visto que pessoas de várias idades e antecedentes de saúde podem voar com a SpaceX e aVirgin Galactic, a probabilidade de alguém necessitar de uma cirurgia de emergência em um voo comercial pode ser mais alta, e a demanda por telecirugiões aumentar com ela.

Um cirurgião controla o cirurgião robô Da Vinci, vendo uma imagem 3D do corpo

Ao mesmo tempo, mais e mais médicos na Terra estão mostrando sinais de abraçar a ideia geral da telemedicina para tratar e diagnosticar pacientes. E pelo ano 2025, o Departamento de Defesa dos EUA quer ter um Aparelho de Trauma que permita que os cirurgiões executem cirurgias em soldados a longa distância.

Dessa forma, as cirurgias do futuro serão realizadas por alguém em outro hospital, ou mesmo em outro país ou planeta? “A ciência já está lá, ” afirma Anvari, “a outra coisa é o que está nos atrasando. ”

Esses temas incluem problemas éticos e de regulação. Em princípio, a tecnologia pode detonar uma nova onda de turismo médico. Pacientes que não podem cobrir os gastos de cuidados médicos nos EUA, por exemplo, pode optar por cirurgiões em outros países. Mas se alguma coisa der errada, quem poderá ser considerado responsável – aqueles no local de operação do robô ou o cirurgião trabalhando desde Cuba?

Talvez a questão mais importante, contudo, é se os pacientes estarão confortáveis com um cirurgião que eles nunca virão frente a frente. Você deixaria um cirurgião remover seus rins ou operar seu coração a centenas de quilômetros de distância? Você logo terá que responder essa pergunta.

 

Fonte: BBC

Editado por: UNA-SUS